segunda-feira, 18 de abril de 2011

Trintinha nos couros!


Metafísica
Em Platão e o mundo das essências.
Convite à Filosofia, de Marilena Chauí, Cap. 6

Numa festa, oferecida por um poeta que ganhou um prêmio por sua poesia, conversam cinco amigos e Sócrates. Um deles afirma que todos os deuses recebem hinos e poemas de louvor, mas nenhum foi feito ao melhor dos deuses, Eros, o amor.
Propõe, então, que cada um faça uma homenagem a Eros dizendo o que é o amor.
Para um deles, o amor é o mais bondoso dos deuses, porque nos leva ao sacrifício pelo ser amado, inspira-nos devotamento e o desejo de fazer o bem. Para o seguinte, é preciso distinguir dois tipos de amor: o amor sexual e grosseiro e o amor espiritual entre as almas, pois o primeiro é breve e logo acaba, enquanto o segundo é eterno. Já o terceiro afirma que os que o antecederam limitaram muito o amor, tomando-o apenas como uma relação entre duas pessoas. O amor, diz ele, é o que ordena, organiza e orienta o mundo, pois é ele que faz os semelhantes se aproximarem e os diferentes se afastarem.. O amor é uma força cósmica de ordem e harmonia do universo.
O quarto prefere retornar ao amor entre as pessoas e narra um mito. No princípio, os humanos eram de três tipos: havia o homem duplo, a mulher dupla e o homem-mulher, isto é o andrógino. Tinham um só corpo, com duas cabeças, quatro braços e quatro pernas. Como se julgavam seres completos, decidiram habitar no céu. Zeus, rei dos deuses, enfureceu-se, tomou de uma espada e os cortou pela metade.
Decaídos, separados e desesperados, os humanos teriam desaparecido se Eros não lhes tivesse dado órgãos sexuais e os ajudasse a procurar a metade perdida. Os que eram homens duplos e mulheres duplas amam os de mesmo sexo, enquanto os que eram andróginos amam a pessoa do sexo oposto. Amar é encontrar a nossa metade e o amor é esse encontro.
Finalmente, o poeta, anfitrião da festa, toma a palavra dizendo: Todos os que me precederam louvaram o amor pelo bem que faz aos humanos, mas nenhum louvou o amor por ele mesmo. É o que farei. O amor, Eros, é o mais belo, o melhor dos deuses. O mais belo, porque sempre jovem e sutil, porque penetra imperceptivelmente nas almas; o melhor, porque odeia a violência e a desfaz onde existir, inspira os artistas e poetas, trazendo a beleza ao mundo.
Resta Sócrates. “Não poderei falar”, diz ele. “Não tenho talento para fazer discursos tão belos”. Os outros, porém, não se conformam e o obrigam a falar. “Está bem”, retruca ele, “Mas falarei do meu jeito”.
Com essa pequena frase, Platão mudará todo o tom do diálogo, pois, “falar do meu jeito” significa: Não vou fazer elogios e louvores às imagens e aparências do amor, não vou emitir mais uma opinião sobre o amor, mas vou buscar a essência do amor, o ser do amor, vou investigar a idéia do amor.
Sócrates também começa com um mito. Quando a deusa Afrodite nasceu, houve uma grande festa para os deuses, mas esqueceram-se de convidar a deusa Penúria (Pênia). Miserável e faminta, Penúria esperou o final da festa, esgueirou-se pelos jardins e comeu os restos, enquanto os demais deuses dormiam. Num canto do jardim, viu Engenho Astuto (Poros) e desejou conceber um filho dele, deitando-se ao seu lado. Desse ato sexual nasceu Eros, o amor. Como sua mãe, Eros está sempre carente, faminto, miserável; como seu pai, Eros é astuto, sabe criar expedientes engenhosos para conseguir o que quer.
Qual o sentido do mito? Nele descobrimos que o amor é carência e astúcia, desejo de saciar a fome e a sede, desejo de preenchimento, desejo de completar-se e de encontrar a plenitude. Amar é desejar o amado como o que nos completa, nos sacia e satisfaz, nos dá plenitude. Amar é desejar fundir-se na plenitude do amado e ser um só com ele.
O que pode completar e dar plenitude a um ser carente? O que é em si mesmo completo e pleno, isto é, o que é perfeito. O amor é desejo de perfeição.
O que é a perfeição? A harmonia, a proporção, a integridade ou inteireza da forma. Desejamos as formas perfeitas. O que é uma forma perfeita? A forma perfeita, acabada, plena, inteiramente realizada, sem falhas, sem faltas, sem defeitos, sem necessidade de transformar-se, isto é, sem necessidade de mudar de forma. A forma perfeita é o que chamamos de beleza. O amor é o desejo de beleza.
Onde está a beleza nas coisas corporais? Nos corpos belos, cuja união engendra uma beleza: a imortalidade dos pais através dos filhos. Onde está a beleza nas coisas incorporais? Nas almas belas, cuja beleza está na perfeição de seus pensamentos e ações, isto é, na inteligência.
Que amamos quando amamos corpos belos? O que há de imperecível naquilo que, por natureza, é perecível, isto é, amamos a posteridade ou a descendência. Que amamos quando amamos almas belas? O que há de imperecível na inteligência, isto é, as idéias. O amor pelos corpos belos é uma imagem ou uma sombra do amor do imperecível, mas o amor pelas almas belas é o amor por algo que é em si mesmo e por si mesmo, imperecível e absolutamente perfeito.


Somente porque hoje fazemos trinta anos de namôro!


Little Coq, meu amor querido,


Como se pode perceber pelo interessante texto, filósofos e poetas divagam desde tempos imemoriais sobre as sutilezas, a consistência (ou a falta dela)... a natureza do amor.
Ainda que a tentativa da compreensão “dele” seja instigante, é infinitamente mais satisfatório vivê-lo, simplesmente.
Conviver com ele; esperá-lo, às vezes impacientemente, tocá-lo, olhá-lo, cheirá-lo, sentí-lo, ...enfim! Ocasionalmente, ainda que irracionalmente, afastá-lo, mesmo que por curto espaço de tempo. Mas, invariavelmente, buscá-lo como um bem imprescindível.
Naturalmente que não poderia partir de mim uma enunciação definitiva do assunto: muitos tentaram; poucos conseguiram, mesmo assim, incompletamente.
Contudo, posso falar sobre o sentimento que assola a minha alma, que inquieta e ao mesmo tempo, apascenta o meu espírito.
Do enorme bem que você me faz!
A conclusão que a autora filósofa parece chegar é que a beleza corporal não passa de uma espécie (e que espécie, hem?) de atrativo, um “feromônio” com fins de aprimoramento da espécie, ao passo que o amor pelas almas belas seja o modelo da perfeição: - Talvez isso explique a facilidade que é amar você.
Já que o amor verdadeiro é imperecível, posso afirmar categoricamente, não sem plagiar o poetinha, que tenho a absoluta convicção que te amarei, enquanto vida eu tiver.
Tu és, e creio que sabes disso, a melhor coisa que jamais poderia ter acontecido na minha existência.
E aconteceu!